segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Tempo de crise, tempo de comunicar.


Saber escolher um bom vinho faz parte de uma cultura urbana contemporânea que assenta, muitas vezes, em princípios estéticos em detrimento de características técnicas e de produção que um connaisseur valorizaria à partida. Podemos verificar este facto noutras áreas de mercado, nomeadamente na proliferação de algumas marcas, de que é exemplo, entre outras, a sueca IKEA, em que os produtos assentam numa lógica de valorização estética com um preço reduzido, permitindo ao consumidor comum ter a sua casa “de revista”.
Num universo com milhares de marcas nacionais e internacionais, e porque um vinho não é só o conteúdo de uma garrafa, mas também a forma como é engarrafado, rotulado, embalado, distribuído e apresentado ao consumidor, deverá existir um cuidado crescente com a forma de comunicar, sendo que o aspecto final do produto dita, em cerca de 50% dos casos, a decisão de compra. Não pretendo naturalmente com isto dizer que se pretenda a “Ikeização” do mercado dos vinhos, mas sim, que se deverá prestar especial atenção às características visuais do produto; e há ainda muito por fazer.
Numa perspectiva de internacionalização, e num momento em que o preço baixo do dólar prejudica inevitavelmente a exportação para os diferentes países que lhe estão anexados, as marcas portuguesas podem, e devem, usufruir da consequente baixa de preços dos canais de comunicação, reforçando os seus investimentos na promoção dos seus produtos no exterior. Em termos de comunicação, julgo ser importante analisarmos a conjuntura internacional numa perspectiva optimista, ou pelo menos de “copo meio cheio”, evitando a habitual inércia justificada pela incógnita da variação das principais bolsas mundiais.
Em países como o nosso, em que é fácil aceder a bons vinhos em diferentes locais, desde as garrafeiras tradicionais, passando pelas grandes superfícies, que começam a ter já uma oferta interessante e representativa das diferentes regiões vitivinícolas, ou pelas lojas gourmet, a internet acaba por ter uma função mais informativa do que comercial, mas que não deverá ser descurada enquanto ferramenta de comunicação. Os sites bilingue (ou “tri”, e por aí fora) são uma tendência natural e, na minha perspectiva, obrigatória, para qualquer marca com ambições de internacionalização. O produtor deverá também ter especial atenção ao nome que dá aos produtos que pretende exportar, uma vez que a fonética da língua portuguesa nem sempre tem uma fácil dicção noutras línguas, e a memorização de um nome é essencial para a sua divulgação. As marcas de vinho portuguesas precisam então de aprender línguas, sair da redundância do vestido preto (que é uma opção elegante mas também comodista), comprar maquilhagem nova, e apanhar um avião à procura de novos desafios.

Souto de Moura+Ângelo de Sousa em Veneza.



Foto: Fernanda Abreu.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Os Moreira.



A Dona Palmira diz, com muita graça, que foi já há 29 anos que se casou, e veio de casa dos pais para ali para Matosinhos, para a Heróis de França. “Nos primeiros tempos chorava de manhã à noite”, até que um belo dia o marido, o Senhor António, se zangou com ela e lhe disse que, se ela não queria estar ali com ele, a ia levar onde a tinha ido buscar, que não queria ali ninguém contrariado. Foi “trigo limpo, farinha amparo”, e viram os filhos a crescer ali na rua e são felizes até hoje. Há 26 anos pegaram no Salta o Muro e, desde aí, fazem também felizes todos aqueles que ali entram para saborear os seus petiscos. Da mobília desta casa fazem parte a Carla, que tem uns olhos de um azul caribenho, e o Augusto, um leixonense ferrenho que ostenta fantásticas pulseiras e anéis de ouro, que lhe dão um toque distinto no manuseio das travessas. A Carla e o Augusto não são Moreira mas são irmãos, e servem naquele restaurante, respectivamente, há seis e oito anos.
À entrada, atrás do seu balcão (e aquele balcão é mesmo dele, porque dali nunca o vi sair, a não ser para se sentar numa das mesas livres para comer com o pessoal, quando terminado o serviço) temos sempre o Sr. António que, de caneta Bic atrás da orelha, vai recebendo quem chega. Quem vai ao Salta o Muro sabe que, à partida, vai esperar, e de pé, o que não é necessariamente um problema, uma vez que o Sr. António sabe bem como entreter os clientes com uns jaquinzinhos fritos, quando os há, umas tiras de presunto cortadas na hora, broa, azeitonas e umas lambretas como só ele as sabe tirar. Uma vez sentados à mesa, são-nos enunciadas, em voz rouca pela Carla, ou numa voz mais aguda pelo Augusto, as iguarias do dia, que são sempre diferentes e boas. Bacalhau assado na brasa, robalo grelhado, raia frita, salmonete, sardinhas (no tempo delas, e ali o tempo delas é levado a sério), ou a caldeirada de peixe, são algumas das sugestões que aqui deixo ficar. Uma vez orientadas as coisas na cozinha, a Dona Palmira faz uma visita às mesas, sempre com uma história engraçada para contar, do tempo em que a Maria Cachucha era nova e as histórias começavam por “Era uma vez...”. Diz-me sempre, “sabe que a vida, às vezes, é complicada mas é muito bonita”. No fim do jantar é-nos servida uma das melhores mousses de chocolate do país.
A decoração é rústica, com as madeiras pintadas de “verde água”, e remete para a época em que o Salta o Muro ainda era uma mercearia e não tinha esse nome, e os trabalhadores das docas saltavam o muro das traseiras para ali irem petiscar qualquer coisa. Os preços por refeição ficam entre os 10 e os 15 Euros.
Podia deixar aqui o número de telefone, mas não vale a pena, uma vez que não se aceitam marcações. O nome da rua está na ali atrás, na primeira frase do texto, e o número da porta é o 386.

6 feet.





An issue.


Ou se pensa, ou os outros pensam por nós e nos dominam, pervertem e disciplinam os nossos gostos naturais; civilizam-nos e esterilizam-nos.”

F.Scott Fitzgerald, In Terna é a Noite.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

domingo, 21 de setembro de 2008

A Sociedade.


"A sociedade, de um modo geral, é assim: suporta mal a graça e o desprendido génio das pessoas e trata de amargar-lhes a vida. Com o génio talvez se queira dizer um sentimento movediço, que não se fixa em nada e se aparenta com a falta de gratidão. Isto é muitíssimo mal recebido num grupo que se empenha em promulgar leis com fins de se defender da sua própria inimizade com os demais."

In Jóia de Família, Agustina Bessa-Luís.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Picasso.


" A partir do momento em que a arte deixa de ser alimento dos melhores cérebros, o artista pode usar todas as artimanhas do charlatão intelectual. As pessoas refinadas, os ricos e os ociosos profissionais, pretendem apenas aquilo que é sensacional e escandaloso na arte moderna. E, desde os dias do cubismo, eu servi esses rapazes com aquilo que eles pretendiam e pacifiquei os críticos com todo o tipo de ideias idiotas que me passaram pela cabeça. Ao mesmo tempo que me entretive com todos esses idiotas, tornei-me famoso e muito rico. Não passo de um palhaço público, uma atracção de feira. É-me penoso confessar isto, mas, no final, é o mais honesto." Pablo Picasso, in The American Mercury, Agosto 1957.

The New Yorker.






E por aí fora...

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Print B



Tom Adler
PRINT B, 2006 (RON STONER/SONNY MILLER)
16x20 INCH PIGMENT PRINT
ED.10

A cidade.


"Instalámo-nos, portanto, na cidade.(...)Falta tempo para o exame de consciência. As ocupações, os negócios, os contactos sociais, a saúde, as doenças e a educação das crianças preenchem-nos o tempo. Tão depressa se tem de receber visitas e retribuí-las, como se tem de ir a um espectáculo, a uma exposição ou a uma conferência. (...)A vida torna-se assim completamente vazia."
Leon Tolstoi, Sonata de Kreutzer.

Soho NY.